Já aqui escrevemos que João Portugal Ramos não é homem de aparecer com frequência perante jornalistas. Por regra, convoca os críticos de dois em dois anos para revelar o que andou a criar nos tempos mais recentes. Ora, como a sua última conferência de imprensa havia decorrido há cerca de um ano para dar a conhecer um dos melhores tintos do pais oEstremus 2011 -, era grande a expectativa para saber o que aí vinha.
Seriam colheitas de excepção das marcas já conhecidas do Alentejo, Douro, Tejo, Beiras ou Verdes? Seriam marcas novas destas regiões ou seria, finalmente, um vinho do Dão? Nada disso. Portugal Ramos chamou os jornalistas para apresentar uma linha de vinhos para miúdos com idade legal para consumo de álcool. Vinhos bem feitos, primorosamente desenhados na adega e no gabinete de marketing e destinados agente gira.
Confesso que, com fumos de snobeira, fiquei decepcionado (desta casa estamos sempre à espera de vinhos marcantes), mas, faça um tinto de €80 ou um branco de €3, Portugal Ramos nunca dá ponto sem nó.
Sim, o vinho é uma necessidade de mercado (a faixa dos três euros e tal é estratégica) e entre o Marquês de Borba e o Lóios faltava uma referência nas prateleiras, mas o enólogo alentejano aproveitou as circunstâncias para criar uma linha de vinhos pensada ao detalhe.
O nome genial (Pouca Roupa), o design das garrafas, o target escolhido e a estreia do filho João Maria enquanto enólogo em todo o processo foram variáveis trabalhadas como quem faz o guião de um filme.
Pouca Roupa é, de facto um nome feliz e só possível no Alentejo. É, de resto, um apelido comum na região e nome de um dos montes onde está localizada a vinha que dá as uvas para os três vinhos.
Sonante e dado a piadas, Pouca Roupa fica facilmente na memória, tanto mais que o design e as cores dos rótulos fazem com que os vinhos se destaquem no imenso mar colorido que é uma normal garrafeira. O rótulo desnivelado e o recorte do lettering da marca deixam sobressair a cor rosada, branca e tinta dos vinhos.
A participação de João Maria na feitura do vinho é, por outro lado, a apresentação mais ou menos oficial do filho de Portugal Ramos no mundo da produção. Depois de ter estudado no estrangeiro e de ter feito vindimas na América do Sul, João Maria continuará os estudos com o melhor professor possível. Quantos estagiários não pagariam para trabalhar com João Portugal Ramos?
Posto isto, convém dizer que os Pouca Roupa piscam o olho a um público muito jovem, irreverente e trendy. Disso não há dúvidas. A malta que tem de levar vinhos para jantar em casa de amigos e já não sabe o que escolher terá aqui um solução que - vinho à parte - dá pano para mangas à mesa. São, todos, vinhos joviais, frescos, com fruta, macios e destinados a comidas de fusão que a malta nova urbana gosta(não se aguentam com pezinhos de coentrada mas isso eles nem cheiram).
E agora que o calor espreita, o Pouca Roupa branco é perfeito para uma esplanada. Cheio de frutos topicais e com ligeira doçura na boca, dá uma boa conversa ao final da tarde. Pela circunstância feliz de não ser nada pesado e nada enjoativo, o rosé é mais que perfeito para uma salada, uma massa ou pizza. O tinto, fresco e com aromas de fruta e madeira, fará a sua função de tinto para pratos de carne não muito temperados. Quem gostar de tintos gulosos (os jovens, pois) faça o favor de se servir.
Não deveria contribuir para especulações absurdas no mundo do vinho, mas fosse eu dono de um wine bar e ia a correr ao Alentejo açambarcar a produção toda.
Como os vinhos estarão à venda ao consumidor por €3,99, imagino eu que sairão da adega por volta dos €2 (ao ponto a que se chegou!), pelo que, num cenário muito conservador, se vendesse copos do Pouca Roupa a €3, ficava rico em dois tempos.
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